Associação de Professores
da PUC Goiás
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Railton Nascimento Souza

O que comemorar hoje, no Dia do/a Professor/a? O filósofo francês Gilles Deleuze já nos avisou há muitos anos que a lógica da empresa passou a dominar todas as antigas instituições disciplinares (igreja, escola, família...) antes assim compreendidas por Foucault como lugares de confinamento, vigilância e punição, onde o indivíduo aprendia a ser "sujeito", sujeito às verdades sociais. O que observamos no dia a dia das instituições de ensino privadas, mas até mesmo nas públicas, é essa lógica agressiva da empresa capitalista. 

A escola é uma máquina contínua de produção de provas em sistema ininterrupto... que não pode parar. Seu fim e grande objetivo é apenas um: o lucro. O professor não pode adoecer, seu pai não pode morrer, seu filho não pode nascer. Um desarranjo intestinal já é suficiente para interromper a produção.  A linha produtiva não pode parar. O/A professor/a deve estar lá em frente ao maquinário escolar na hora, minuto e segundo exatos. Essa lógica faz com que a quantidade seja mais importante que a qualidade. Aulas, aulas e aulas... segunda, terça, quarta, quinta, sexta, sábado, domingo, e se não impedidos pela lei, até mesmo nos feriados e dias santos. Os alunos fazedores compulsivos de provas, recebem um bombardeio de informações, e muitas vezes não conseguem fazer uma adequada conexão entre elas para compreender a realidade na sua totalidade. Para fazer uma leitura política e ética das relações sociais nas quais estão implicados.

Algumas vezes o ambiente escolar é triste. O "dionisíaco" quase que inexiste. Jovens pálidos/as, máquinas também, mecânicos, "apolíneos" demais em plena juventude, como diria o mestre Nietzsche. Uma racionalidade do mercado impera nas escolas, treina e prepara infinitamente fazendo provas e preparando para novas provas... Agora a prova da vez é o tão esperando ENEM. A arte, a vida, a música, o teatro, o riso, o lúdico, o desportivo, o bater do violão, o diferente, a alegria de viver, as pulsões criadoras, o exercício juvenil da liderança política estudantil, a "desordem 'ordenadora' de Dionísio" que faz  a alma encontrar sua 'sanidade' ao se expressar com o grito cênico, não encontram lugar nessa maquinaria. Como no The Wall do Pink Floyd, estamos todos caminhando enfileirados para essa a "moeção". Com esse sangue e carne humanas fazemos o sistema funcionar. 

Estamos na época do controle. Agora quando aqui vos escrevo no facebook, na iminência de entrar para a sala de aula nesse  15 de outubro de 2013, dia do professor, sei que sou controlado e que também controlo. Essa rede social aqui é um poderoso instrumento de controle. Todos/as estão vigiando a todos/as. O que cada pensa, o que cada diz, suas tendências ideológicas, suas posições políticas. Mas vivemos, cremos, num regime democrático de liberdades. Aliás alguns ainda creem que esse sistema tem como maior valor político e cívico, a liberdade. Muitos ainda pensam que a liberdade de imprensa, por exemplo, é autêntica liberdade de expressão, e não liberdade de "empresa" comprometida tão somente com seus dividendos. O uso autêntico da liberdade é um exercício daqueles que decidiram ser autárquicos/as. 

Afinal, o que devemos comemorar hoje? Comemorar a força de cada colega, de cada professor/a que apesar de muitas vezes não serem devidamente respeitados ou reconhecidos/as como educadores/as, mas vistos como "dadores/as de conteúdos, repetidores de saberes vistos", "descartáveis" especialmente quando passam dos cinquenta ou sessenta, mudam a realidade, abrem perspectivas novas para seus/suas discentes, alimentam sonhos, fomentam o novo e formam a cidadania.

Parabéns aos/às colegas que muitas vezes doentes, estão diante de seus/suas alunos/as com um sorriso no rosto. Parabéns aos colegas que ainda têm forças para ensinar com alegria, mesmo depois de horas e horas corrigindo centenas de provas. Parabéns aos colegas que nunca ouviram de seus/suas diretores/as ou coordenadores/as, um elogio sequer pelo seu genial trabalho. Parabéns às/aos professoras/es que cuidam de crianças tão pequenas, que levam tanto trabalho para casa, e que não recebem nem um centavo de hora atividade por isso. Parabéns aos/às professores/as que, ainda em um ambiente desumano, estranho, de relações tão frágeis, cultivam laços de amor e amizade. Parabéns aos/às alunos/as por manifestarem tanto carinho e amor aos/às mestres. Parabéns àqueles que mesmo não vendo esperança no horizonte, insistem em mantê-la como força utópica que os move rumo ao amanhã. Parabéns colegas, parabéns seu dia!

 

Railton Nascimento Souza, docente no ensino superior e médio, é especialista em ensino de filosofia pela Universidade de Brasília (UnB), diretor de formação da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil e diretor de formação do Sinpro Goiás


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