Profa. Lucia Rincon
A democracia se amplia e se aprofunda no Brasil. As mulheres contribuem decididamente com este processo através da multiplicação de suas ações, sejam de intervenção social, sejam de intervenção política. As três conferências realizadas por iniciativa do governo federal deram visibilidade a este processo, coroando no Brasil décadas de luta aberta contra a opressão, luta coroada pela conquista de reconhecimento de humanidade, cidadania, direitos.
Usufruindo desses direitos, impulsionadas pela necessidade e pela busca de realização por participar da vida pública, fomos ocupando espaços no mundo do trabalho, no mundo político, sem entretanto nos livrarmos das condições de desigualdade. A divisão social e sexual do trabalho permanece injusta e as mulheres ocupam os lugares menos prestigiados e mais mal remunerados. Avançar na superação disto hoje significa aprovar a redução da jornada de trabalho de 44 para 40 horas e o PL 4857/2011 que garante igualdade salarial e de condições de trabalho entre homens e mulheres, como forma de incentivo à vida profissional e acadêmica das mulheres.
Conhecidas principalmente como provedoras e cuidadoras, as mulheres são consideradas as únicas responsáveis pela reprodução humana, as principais responsáveis pelo trabalho doméstico, não encontrando compartilhamento para as tarefas domésticas nem no núcleo familiar nem no Estado. Precisamos assegurar mais equidade no mundo do trabalho e apoio no compartilhamento das tarefas junto à família, e redes de equipamentos sociais como creches, lavanderias, restaurantes populares, centros de convivência. Os homens dedicam 4,3 horas semanais às atividades domésticas, ao passo que as mulheres dedicam 18,3 horas semanais.
À sociedade cabe garantir uma educação inclusiva, não sexista, não racista, não homofóbica, não lesbofóbica, pois embora sejamos 61% do contingente de estudantes que conclui o ensino superior, somos discriminadas profissionalmente e somos também a maioria entre os 15 milhões de analfabetos. A realização da Conferência Nacional de Educação (CONAE 2014), em pleno andamento, abre uma grande avenida para propormos caminhos e ações que serão decisivas para a mudança nas mentalidades e nas condições de vida das mulheres com mais creches e escolas de período integral, imprescindíveis para homens e mulheres viverem a vida em condições de igualdade.
Uma verdadeira democracia impõe assegurar mais espaços de poder à maioria da população brasileira e do colégio eleitoral, que são as mulheres, e aumentar nossa presença nos espaços de representação política , que hoje está em 14,8% no Senado Federal, 8,7% na Câmara de Deputados, 12,85% dos legislativos estaduais e 9,2% entre @s gestor@s municipais. A efetiva aplicação por cada partido, da lei que estipula 5% do fundo partidário destinado à formação politica das mulheres, contribuirá para alterar este quadro. Postergada todos os anos, a reforma politica torna-se cada vez mais imprescindível na construção da participação da mulher em condições de igualdade pois destituídas de poder econômico, poderão passar a contar com financiamento público de campanha, e lista fechada com alternância de gênero.
Garantir a vida das mulheres hoje, passa pela instalação de delegacias especializadas, juizados especiais, centros de referência e casas abrigo pois o Brasil é o sétimo país do mundo com maiores índices de assassinatos sendo que a cada 5 minutos uma brasileira é agredida e a cada 2 horas uma é assassinada. Cabe atuar na prevenção, denúncia e punição para os crimes de tráfico de mulheres e escravidão sexual e promover o reconhecimento de nossa condição de seres humanos e agentes sociais com mais respeito à nossa imagem no espaço público e privado, promovendo a imagem da mulher real pelos mais diferentes meios de comunicação de massa.
A cada dia mil brasileiras morrem durante o parto, quinhentas mil morrem anualmente durante a gravidez e o parto, e duzentas mil são internadas por ano em consequência de aborto inseguro. A assistência à saúde passa por assegurar o Fortalecimento do SUS com garantia de ampliação da rede de atendimento com respeito ao corpo e à diversidade das mulheres nas muitas fases de suas vidas, e a legalização do aborto como forma de fazer cumprir a agenda dos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres como um direito humano, enfrentando o aborto clandestino como um grave problema de saúde pública que mata milhares de mulheres todos os anos.
Para abrir os caminhos para a emancipação é preciso denunciar a discriminação e a injustiça, e mobilizar para garantir o aprofundamento e ampliação da democracia voltada para corrigir as injustiças sociais e dar condições de vida digna às pessoas, e entre elas, também às mulheres, mais oprimidas. Ter a presidenta Dilma na condução das políticas de governo e de Estado, tem objetivamente registrado significativa diferença positiva. É avanço significativo a criação de um ministério e de secretarias estaduais e municipais que se ocupem de políticas públicas especificamente voltadas para as mulheres. Entretanto, as estatísticas e os noticiários mostram que precisamos mais, no País, nos Estados e nos Municípios.
As conquistas que tivemos ainda são insuficientes. É preciso exigir a ampliação de políticas públicas que permitam melhor articulação entre a casa e a rua, entre o espaço privado/doméstico e o espaço público, entre as responsabilidades familiares e as responsabilidades sociais. É preciso garantir a homens e mulheres as mesmas condições para viver ambos os mundos. E para isto é necessário manter uma perspectiva estratégica que vislumbre a construção de novos valores, novas práticas, novas relações sociais e de gênero, pautadas em princípios de humanidade e solidariedade.
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*Profa. Lúcia Rincón é membro do Centro Popular da Mulher de Goiás (COM), da União Brasileira de Mulheres Seção Goiás (UBM-GO), do Conselho Nacional dos Direitos da Mulher (CNDM) e secretária da Associação de Professores da PUC Goiás (APUC)