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Professores/as do ensino superior estão adoecendo e a causa pode estar relacionada ao exercício de sua função, alerta estudo da psicóloga Marisa A. Elias, do campus de Ribeirão Preto da USP, realizado com docentes de instituições da rede privada de ensino superior da cidade de Uberlândia (MG).

 

“A precariedade do trabalho, resultado do rápido crescimento dessas instituições, parece incrementar os problemas de saúde, principalmente os adoecimentos de ordem psíquica”, garante a pesquisadora, que está desenvolvendo estudos relacionando a saúde com o exercício da docência em instituições de ensino superior, para seu doutorado no Programa de Pós-graduação em Psicologia da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP) da USP.

O investimento do Governo Federal no ensino superior privado, priorizado nos últimos anos — como a criação de programas de incentivo de entrada nestas instituições (o FIES, Fundo de Investimento no Ensino Superior é um exemplo) — vem, segundo Marisa, promovendo rápido crescimento dessas instituições, transformando-as em grandes redes educacionais.

Para a pesquisadora, essas ações propiciam o aumento do acesso a este nível educacional, cumprindo exigências do Banco Mundial. Mas, em contrapartida, abrem espaço para a mercantilização da educação e, com ela, a redução de custos da “mercadoria ensino” que, por sua vez, afeta diretamente os profissionais que atuam no setor.

Com o objetivo de verificar como anda a saúde desse profissional nesse cenário, Marisa escolheu Uberlândia, cidade referência no ensino superior na região, com mais de 20 instituições de ensino superior privado e uma universidade federal. O município tem 611 mil habitantes, conforme o último censo (2011), e é considerado polo neste tipo de ensino.

Missão profissional não permite adoecimento

A psicóloga verificou, num primeiro momento, que os professores diziam não ter problemas de saúde. Mas, conforme seguiam com a entrevista, “se assustaram ao perceber que apresentavam diversos problemas não reconhecidos e banalizados”. Todos eles admitiram sentir dor de cabeça frequentemente; dores no corpo; fazer uso ou já ter usado medicação para refluxo e gastrite, para alergias, para insônia e rouquidão ocasional. Estes sintomas, alerta a pesquisadora, podem estar associados ao estresse e podem ser considerados adoecimentos psicossomáticos.

Ela lembra que na falta de condições de descarregar o mal-estar mental, “o corpo é a via possível de descarga”. E as evidências ficam claras nas respostas e atitudes desses professores. Marisa diz que eles relataram desencanto e frustação com suas realidades profissionais, mas ao mesmo tempo “não se permitiam adoecer”, devido à ética que assumem. “Eles exigem de si mesmos o cumprimento das exigências profissionais e ignoram os sinais do próprio corpo para o desgaste, inclusive se vangloriando por não se ausentarem do trabalho”.

Para a pesquisadora, a constatação desses problemas de saúde mental é devido à “precarização da educação” à qual os docentes universitários são submetidos: carga horária superior a oito horas diárias, geralmente mais de dez, sem considerar o número de horas executadas em casa; a contratação por hora aula, provocando constante sentimento de insegurança — cada semestre muda a remuneração recebida e a preferência, das instituições, por profissionais multitarefas que ministram diferentes disciplinas, sem respeitar a especialidade do profissional.

Outro fator que reforça o quadro é a “preservação da idealização da atividade de educador”. A psicóloga garante que essa idealização aliena e prende o profissional à “representação do trabalho como missão e não atividade profissional”. O professor vive então em contradição, se submete a condições fisicamente desgastantes e também à pressão psicológica potencialmente causadora de adoecimento.

A ambiguidade prevalece ainda com relação aos sentimentos de frustração — pela falta de reconhecimento de seus esforços pelos próprios alunos e pela desvalorização da imagem profissional — e de satisfação — ao perceberem esse mesmo reconhecimento de seus trabalhos.

Os resultados preliminares do estudo de Marisa, sob orientação da professora Vera Lucia Navarro, mostram “que as condições de trabalho no ensino superior privado descaracterizam a função da educação e proporcionam aos professores desgaste, mal-estar e adoecimento”. Para a pesquisadora é preciso, urgentemente, denunciar essa situação e promover discussões, buscando “estratégias preservadoras e promotoras da saúde destes profissionais, o que passa pelo fortalecimento da organização do movimento docente, pelo fortalecimento sobretudo do sindicato, com apoio da sociedade para que esta atividade, tão importante, possa ser desenvolvida em condições que respeitem a saúde dos seus trabalhadores”.

Fonte: Agência USP

Leia aqui a entrevista exclusiva com a professora da PUC-SP e médica do trabalho, Margarida Barreto, sobre o assédio moral - uma das principais fonte de adoecimento no ambiente de trabalho


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