O Conselho da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília (UnB) publicou uma nota onde condena o que chama de conduta "omissa e complacente" de Augusto Aras à frente da Procuradoria-Geral da República (PGR), diante das "constantes investidas que o atual governo tem feito contra o sistema eleitoral brasileiro, os Poderes da República e a estabilidade constitucional".
O colegiado reúne professores/as, representantes dos servidores técnico-administrativos e de alunos da faculdade, onde Aras é professor desde 2007. Atualmente, ele está licenciado para se dedicar ao Ministério Público Federal (MPF).
No texto, o Conselho da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília afirma que "para além das tentativas de intimidação das instituições democráticas, o Presidente da República tem acenado quase diariamente com indicativos de ruptura institucional, chamando, inclusive, as Forças Armadas a sustentar seu discurso autoritário e obscurantista".
Segundo o grupo, "no quadro de grave crise política, econômica e social que o País hoje atravessa, caberia ao Ministério Público (MP) manifestar-se de forma enérgica contra os posicionamentos do Presidente da República".
Ainda segundo o documento, o "estranhamento mais se acentua" pelo fato de a PGR ser comandada por "um professor desta Faculdade que vem deixando de praticar, ou vem retardando, atos que são dever de ofício do elevado cargo que ocupa, o que, no final das contas, atende apenas aos propósitos do Presidente da República em sua postura permanente de investir contra as leis e o equilíbrio institucional".
"Atitudes omissas como as que vêm caracterizando a conduta do Procurador-Geral da República atentam contra os valores da Universidade, conspurcam nossa consciência crítica e depõem contra nossas melhores tradições democráticas. A independência do Ministério Público, assim como a atuação profissional dos docentes da Faculdade de Direito da UnB, estejam onde estiverem, deve se pautar sempre pela independência e pelo permanente empenho em fazer valer os princípios constitucionais", diz a nota.
Véspera de sabatina
O posicionamento contrário ao PGR ocorreu na véspera da sabatina de Augusto Aras para mais um mandato à frente do órgão. Ele foi ouvido na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado na terça-feira (24/08). A recondução acabou sendo aprovada na Casa para que Aras permaneça na PGR por mais dois anos.
Veja, a seguir, a nota na íntegra:
"Nota do Conselho da Faculdade de Direito da UnB
O Conselho da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília, que reúne os docentes e representantes do corpo discente e dos servidores técnico-administrativos da Faculdade, vem manifestar sua veemente condenação à postura omissa e complacente que a Procuradoria-Geral da República vem adotando frente às constantes investidas que o atual governo tem feito contra o sistema eleitoral brasileiro, os Poderes da República e a estabilidade constitucional.
Para além das tentativas de intimidação das instituições democráticas, o Presidente da República tem acenado quase diariamente com indicativos de ruptura institucional, chamando, inclusive, as Forças Armadas a sustentar seu discurso autoritário e obscurantista.
No quadro de grave crise política, econômica e social que o País hoje atravessa, caberia ao Ministério Público (MP) manifestar-se de forma enérgica contra os posicionamentos do Presidente da República, pois o papel que cabe ao MP na defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, emana do texto literal da Constituição (art. 127, § 1º).
Frente à escalada de ameaças à ordem constitucional e democrática, é inadmissível que o Ministério Público, e em especial o Procurador-Geral da República (PGR), transija ou se mantenha inerte, deixando de cumprir seu indeclinável dever de defender o Estado Democrático de Direito.
Nosso estranhamento mais se acentua por termos, à frente dos destinos da Procuradoria-Geral da República, um professor desta Faculdade que vem deixando de praticar, ou vem retardando, atos que são dever de ofício do elevado cargo que ocupa, o que, no final das contas, atende apenas aos propósitos do Presidente da República em sua postura permanente de investir contra as leis e o equilíbrio institucional.
Soma-se a esse procedimento inaceitável a decisão do PGR de processar criminalmente professor universitário por críticas dirigidas à sua atuação, o que implica a tentativa de cercear a liberdade acadêmica que deveria ele ser o primeiro a prestigiar.
A defesa da ordem jurídica e do respeito à Constituição é dever de todos os membros da comunidade acadêmica da UnB – Universidade que teve, em seu nascedouro, a presença de nomes como Victor Nunes Leal, Waldir Pires, Machado Neto, Roberto Lyra Filho, Ieda Santos Delgado e tantos outros homens e mulheres que dedicaram suas vidas à causa da democracia e do direito.
Atitudes omissas como as que vêm caracterizando a conduta do Procurador-Geral da República atentam contra os valores da Universidade, conspurcam nossa consciência crítica e depõem contra nossas melhores tradições democráticas. A independência do Ministério Público, assim como a atuação profissional dos docentes da Faculdade de Direito da UnB, estejam onde estiverem, deve se pautar sempre pela independência e pelo permanente empenho em fazer valer os princípios constitucionais.
Brasília/DF, 23 de agosto de 2021."