Associação de Professores
da PUC Goiás
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No processo de tramitação do Plano Nacional de Educação (PNE), o deputado Paulo Rubem Santiago (PDT-PE) foi um dos árduos defensores da exclusividade da destinação dos investimentos de 10% do Produto Interno Bruto (PIB) para o setor público, assim como reivindicado pela Contee e pelas demais entidades nacionais que defendem o fortalecimento da educação pública. Confira, a seguir, a entrevista concedida à Contee

Contee – Com a conclusão da votação PNE, como o senhor avalia os debates realizados nestes três anos e meio de tramitação e o resultado final para a educação brasileira?
Paulo Rubem – Sem a participação da sociedade civil e das entidades da educação, em especial da Contee, da CNTE e do Andes e Fasubra, não teríamos obtido os avanços que colhemos. Seria difícil vencer as pressões da área econômica do governo federal, sempre batendo na tecla da escassez de recursos para financiarmos corajosamente um plano da dimensão do PNE. Além disso, foram também fundamentais a presença das entidades estudantis e da Campanha Nacional pelo Direito à Educação. A Campanha nos ajudou muito na defesa da meta de financiamento, os 10% do PIB para a educação. Lembro que quando o projeto chegou a proposta era de 7%. O relator elevou para 8%. Fiz a emenda dos 10% e sustentamos com sólidos argumentos e com o apoio de vocês. O Plano tem inúmeros avanços, mas o principal não veio. Verbas públicas para metas de educação pública. Isso é grave, pois a expansão da oferta de vagas nas instituições privadas tem tido um crescimento alucinante e agora eles tentam aprovar a liberação do Fies para as matrículas à distância. Nisso aí, novamente, foi nosso o destaque para que os 10% do PIB investidos estivessem focados na educação pública. Perdemos. Foi uma contradição ver a bancada do PT defendendo verba pública para instituições privadas. Uma agressão à memória de Florestan Fernandes.

Contee – Na sua avaliação, cumprido o desafio de aprovar o PNE, quais as principais batalhas que precisam agora ser travadas no Congresso Nacional em defesa da educação, sobretudo pensando que, a partir do ano que vem, se inicia uma nova legislatura?

PR – A maior batalha é tirar a lei do papel. Esperamos a sanção sem vetos pelo governo. Depois a sociedade e as entidades educacionais devem pensar na criação de observatórios do PNE no país todo. As entidades que se mobilizaram devem continuar mobilizadas. Os atuais Conselhos de Acompanhamento da Educação (municipais e estaduais e os Conselhos do Fundeb) são frágeis, sem estrutura, informação e autonomia. Serão dez anos de investimentos, cumprimento de metas e qualidade para a educação brasileira, direito essencial da sociedade. Portanto, arregacemos as mangas e vamos em frente. Muito que fazer.

Contee – Uma matéria muito cara à Contee e que ainda se encontra em tramitação no Congresso é o Projeto de Lei 4.372/12, que cria o Instituto Nacional de Supervisão e Avaliação do Ensino Superior (Insaes). Quais as suas considerações sobre essa proposta e sobre o processo de financeirização do ensino superior no Brasil?
PR – O setor privado não quer controle, regulação, fiscalização. Quer apenas investir para obter a maior taxa de retorno possível. A qualidade desses “empreendimentos” é revelada regularmente com várias instituições reprovadas pelo MEC e diversos cursos fechados. Mas o interesse pelo negócio é imenso. Isso se amplia agora com o avanço dos fundos que controlam as grandes instituições que abriram seu capital na bolsa de valores. Para eles a educação superior é um “ativo” e a oferta de vagas na graduação “um negócio”. Enquanto lhes render uma taxa de retorno imbatível eles prosseguirão, de preferência financiados pelo Estado, com ProUni e Fies.

Felizmente temos sólida produção acadêmica nas universidades, denunciando essa aberração do privado mantido pelo público. O professor Pedro Paulo Bastos, da Unicamp, publicou excelente texto sobre a financerização e a educação superior. Outro trabalho excelente é do professor Nelson Amaral, da Universidade Federal de Goiás, intitulado “Constrangimentos socioeconômicos no acesso à educação superior no Brasil”, artigo publicado no livro “Para onde vai o dinheiro: caminhos e descaminhos do financiamento da educação no Brasil”, de 2014, da Editora Xamã. Como disse antes aqui, o setor privado já antecipa sua próxima jornada de interesses: vão solicitar a liberação do Fies para pagamento de matrículas no ensino à distância. Defendi que os 10% do PIB estivessem focados na educação pública pois a maior parte das metas do PNE terá repercussão nas redes municipais de ensino (das creches ao ensino fundamental). Do outro lado, o país precisa expandir a produção acadêmica, científica e tecnológica e isso quem faz são as universidades públicas.

Estamos numa posição cada vez menor na comparação com a China, a Rússia, a Índia e a África do Sul na participação de nossos produtos de exportação nas cadeias globais de valor. Voltamos a ser exportadores de bens primários e básicos e grandes importadores de bens de capital de média e alta tecnologia. Por isso temos que investir amplamente nas universidades públicas e na pós-graduação em todo o território nacional. Como ficou no PNE, com o privado disputando verbas públicas dentro dos 10% do PIB, haverá uma óbvia pressão do privado sobre a destinação de recursos, com graves consequências sobre os percentuais que deverão ser aplicados na educação infantil e no ensino fundamental de um lado e, na outra ponta do sistema, na graduação e na pós-graduação públicas. Um equívoco. Vamos enfrentar isso nas ruas, nas escolas, nas redes públicas municipais e estaduais. Além disso temos que avançar na defesa intransigente das condições de trabalho com dignidade e autonomia dos professores da rede privada, na educação básica e na educação superior. A valorização dos profissionais da educação é uma bandeira única, embora essa condição se exerça com várias peculiaridades. Nosso mandato sempre esteve e estará ao lado desses trabalhadores e trabalhadoras.

Fonte e foto: Contee


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