Associação de Professores
da PUC Goiás
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Toda a barbárie cometida contra trabalhadores/as no período da ditadura brasileira pôde acabar com os ideais de um jovem? A história do professor Vanderson Roberto Corrales Lao demonstra que não. Vítima de tortura aos 16 anos e muito traumatizado com a experiência, contou com o apoio de militantes politizados para compreender a conjuntura política do país e, anos depois, contribuiu na luta dos trabalhadores/as como diretor no Sindicato dos Metalúrgicos de Sorocaba e Região e na Apeoesp, além do trabalho exercido há 29 anos como professor de história.

O professor Vanderson, que atualmente leciona na rede pública de ensino, foi sindicalizado ao Sinpro enquanto atuou na rede privada e é o indicado do Sindicato para receber homenagem do Grupo de Trabalho “Ditadura e Repressão aos Trabalhadores e ao Movimento Sindical” da Comissão Nacional da Verdade, em ato  realizado no dia 26 de julho, no Salão de Festas do Sindicato dos Empregados no Comércio de Sorocaba.

O Grupo de Trabalho tem o objetivo de lembrar a resistência dos/as trabalhadores/as e dirigentes sindicais à perseguição e repressão que sofreram durante a ditadura civil-militar de 1964 a 1985. “Exigimos o fim da impunidade dos crimes cometidos contra os trabalhadores e suas organizações e queremos reparação e justiça”, destaca o material de divulgação do evento.

“Enquanto dirigentes sindicais e professores/as, nós, do Sinpro-Sorocaba, reconhecemos que a tortura sofrida pelo prof. Vanderson e muitos outros trabalhadores/as não pode ser esquecida e cair na impunidade. A memória de lutas e conquistas dos que sofreram e se sacrificaram para a construção da liberdade que hoje temos, deve ser reconhecida e preservada”, avalia o professor Cristiano Leon Martins, presidente do Sinpro.

1976: um ano de renascimento para o professor Vanderson

O ano era 1976. O movimento sindical se agitava na expectativa de uma primeira Greve Geral. Nesse contexto, o jovem Vanderson Roberto Corrales Lao, nascido em 17 de outubro de 1959, não havia completado, ainda, 17 anos quando trabalhava na antiga empresa “Klink”, atual “Arthur Klink”, e era “sócio clandestino” do Sindicato dos Metalúrgicos, sem nenhum envolvimento político, neste momento. “Como, na época, não havia o desconto direto da mensalidade de sócio, fui à sede do Sindicato para fazer o pagamento, sempre tendo o cuidado de observar se não havia nenhum ‘pipoqueiro’ em cima de poste, porque a coisa era muito complicada. Lá peguei alguns panfletos falando da greve e saí distribuindo”, relembra. “Quando cheguei à Fepasa [antiga estação ferroviária], encontrei um militante de partido de esquerda que me alertou para ter muito cuidado com aquele material. Saindo de lá, já estava subindo a rua Aparecida quando acabei sendo preso”.

Segundo o professor, as pessoas que o abordaram não estavam fardadas, mas dirigiam um camburão onde o obrigaram a entrar. “Eles queriam o panfleto que eu estava distribuindo, mas como eu havia sido alertado anteriormente, assim que os avistei, joguei num terreno”, recorda. “Primeiramente, me levaram para um local que acredito que seja perto da Rodovia Castelinho; lá me giraram, fizeram coisas para me desnortear. Depois disso, eu não sei para onde fui, mas deram muitas voltas… eu penso que foram em direção à estrada velha de Aparecidinha”, conta.

“Era uma sala escura, um lugar isolado, parecido com aqueles ambientes que a gente vê em filme”, descreve o professor. “Ali me bateram bastante e me deram muito choque – tanto que eu tenho medo disso até hoje; trabalho sempre com o disjuntor desligado”, relata ainda abalado. “Eu ficava dizendo que jurava por Deus que não conhecia absolutamente ninguém… foi um negócio absurdo”.

Depois de toda a agressão sofrida, em mais de oito horas de apreensão, o professor Vanderson foi abandonado nas imediações do antigo Hospital São Vicente, atual Policlínica, já de madrugada. Aos pais, disse que havia se envolvido numa briga, por causa de meninas. Até hoje, revelou a experiência a poucas pessoas, entre elas, aos filhos, há apenas cinco anos. “Foi terrível, foi humilhante, foi vexatório…”, avalia.

Revoltado com o ocorrido, apesar do silêncio, o professor diz que conheceu uma pessoa bastante politizada, na fábrica onde trabalhava, que explicou toda a conjuntura da política nacional da época. “Na escola, tudo era muito velado. Eu tive um professor que era um pouquinho mais de vanguarda, que falava umas coisas sobre o Governo, mas os demais não”.

Anos depois, Vanderson se engajou no movimento sindical. “Por um bom tempo, atuei no Sindicato dos Metalúrgicos e quando me tornei professor, fui para a Apeoesp”, informa. “Eu era totalmente ingênuo quando tudo aconteceu. Até havia feito um curso, mas tudo na tentativa de defender os direitos dos trabalhadores mesmo, não havia nenhum movimento no sentido político, contra o Governo”, explica.

Perguntado se gostaria de destacar algo sobre esta vivência, emocionado, o professor disse: “Foi muito estranho, muito complicado para mim. Convivi com sofrimento, angústia, medo de tudo, medo de sair na rua. Quando ouço algumas pessoas falarem que têm saudades desta época, me dá até um mal-estar, porque elas não imaginam como foi um tempo terrível”, desabafa.

Fonte: Contee com informações de Glauciane Castro, Assessora de Imprensa do Sinpro-Sorocaba


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